quarta-feira, 1 de junho de 2016

ARTIGO CIENTIFICO

Proposta de atividade vincula à disciplina de Análise do Discurso com a orientação e coordenação da Profª Joana Ormundo.
Grupo de letras - Campus Vergueiro
Universidade Paulista UNIP - SP

 A Representação Cultural da Mulher Brasileira

INTRODUÇÃO

 A análise do discurso francesa surgiu na década de 1960 para estudar a sociedade daquela época, seus antecedentes e suas características, principalmente no campo político-econômico. Muitas noções do que é “discurso”, sujeitos entre outras tipologias foram desenvolvidas desde então. Chegou-se a um consenso de que só é possível estudar um determinado discurso conhecendo seu contexto sócio-histórico-ideológico, para então atingir determinadas conclusões a respeito de como e porque foi construído, qual a importância e o impacto social que ele tem e quais mecanismos de “reprodução” do discurso foram necessários.
 Baseando-se nessa teoria, este trabalho pretende analisar o contexto cultural da representação da imagem feminina, sobretudo do carnaval, da sociedade brasileira do séc. XXI a partir da análise de imagens publicadas pela mídia que circulam socialmente.
 Dentre tantos espaços que poderiam ser analisados como: a mulher na música, no ambiente doméstico, no trabalho, no teatro, etc. Foi escolhido o tema do carnaval, pois este teoricamente é um espaço de “livre” expressão e “respeito” que muitas vezes por estar blindada por esta ideia a sociedade não enxerga (ou não quer enxergar) os mecanismos de poder que o cercam.

I - PRINCÍPIOS TEÓRICOS

 A análise do discurso francesa (AD) propõe uma observação do discurso levando em consideração o contexto sócio-histórico-ideológico, bem como sua descrição a partir de “categorias analíticas”. Antes de iniciar a análise proposta neste trabalho, é preciso explicitar essas categorias e a noção de “ideologia”.

1.1 - Ideologia segundo Althusser

 Para que as classes dominantes continuem com o poder e controle da sociedade é preciso “reproduzir as condições de produção”, isto é, fazer com que a ideologia vigente continue a governar as classes inferiores. Mas de que maneira é feita essa “reprodução”? Althusser (1985) afirma que:
É, em grande parte, assegurada pelo exercício do poder de Estado nos aparelhos de Estado, no Aparelho (repressivo) de Estado, por um lado, e nos Aparelhos Ideológicos de Estado, por outro lado. pg. 53 – 54.
 São, portanto, responsáveis pela reprodução da ideologia os AIE que podem recorrer a alguma sanção quando necessária, no entanto, não são capazes de repreender aqueles que fogem à sua ideologia de maneira mais “drástica”, daí a importância da existência dos ARE que pressupõem uma repressão direta (que pode ser física, psicológica ou até moral) para garantir a perpetuação da ideologia do Estado (entende-se por “Estado” o poder macroeconômico que rege a sociedade).

1.2 - Categorias Analíticas segundo Eni Orlandi

 Para realizar uma análise mais profunda do discurso é preciso ir além dos fatores linguísticos e estruturais presentes nos textos, ou seja, aprofundar-se no discurso é aprofundar-se no contexto “sócio-histórico-ideológico” (condições de produção), reconhecendo o sujeito do discurso e sua memória discursiva, formação discursiva e formação ideológica. Para Orlandi (2005): “[...] os sentidos não estão só nas palavras, nos textos, mas na relação com a exterioridade, nas condições em que eles são produzidos e que não dependem só das intenções dos sujeitos” pg. 30.

 Todas essas categorias estão sempre presentes em qualquer discurso, sendo a principal delas a noção de “sujeito” que segundo Ferreira (2005):
O sujeito é constituído a partir da relação com o outro [...]. Assim, a incompletude é uma propriedade do sujeito e a afirmação de sua identidade resultará da constante necessidade de completude. Pg. 6.
 Todo sujeito é carregado ideologicamente por sua formação discursiva, em outras palavras é a formação que o sujeito tem contato e em seu discurso reproduz ideais e marcas dessa formação. Sendo assim nenhum sujeito é autônomo ou “dono” do seu dizer, ele está sempre reproduzindo através de paráfrases e polissemia discursiva as ideias já existentes em outros discursos.

Quando o sujeito acredita ser dono do seu saber tem-se o completo assujeitamento, ou seja, a ilusão de autonomia. O sujeito não percebe que está vinculado a aparelhos ideológicos de estado que estabelecem sua formação discursivo-ideológica e determinam o que pode e o que não pode ser dito.

 O acesso ao conhecimento dos discursos já produzidos é chamado de memória discursiva, com ela estão relacionamos também os esquecimentos no discurso que são um mecanismo de “apagar” ou desconsiderar discursos antecedentes, isto pode ser feito de forma inconsciente ou consciente com o objetivo de desfocar causando uma “opacidade”.

II- A REPRESENTAÇÃO CULTURAL DA MULHER BRASILEIRA DE ACORDO COM AS CATEGORIAS ANALÍTICAS

 Segundo Daniel Brazil jornalista da Revista Música Brasileira, o espaço para as mulheres na música foi por muito tempo renegado. Este fenômeno não acontece apenas neste campo artístico, mas também na literatura, no teatro, na dança, no cotidiano etc. Sendo este um campo de pesquisa abrangente, a seguir será discutida a construção da imagem da mulher numa das maiores festas brasileira, o carnaval.

2.1 – Construção midiática

 A formação discursiva do “ideal feminino” para o carnaval é de uma mulher jovial, “sarada”, sensual e que desfila usando pouca roupa; muitas vezes, a roupa é produzida com maquiagem artística e um tapa-sexo.

 Nas imagens a seguir, pode-se encontrar as características anteriormente citadas.
(Mulher Melão – Carnaval 2016)
http://goo.gl/yVqZfc
(Juliana Alves – Carnaval 2016)
http://goo.gl/XqzXDj



 Neste contexto, diversos aparelhos ideológicos como: a mídia, a família e a escola contribuem para a repercussão deste ideal.

 A mídia na medida em que exalta estes modelos como “padrões” constrói uma opacidade no discurso, fazendo com que outras estéticas femininas não tenham tanta visibilidade, pois não atendem aos ideais dessa cultura, levando parte da sociedade a um assujeitamento que segundo Orlandi (2005) “O sujeito diz, pensa que sabe que sabe o que diz, mas não tem acesso ou controle sobre o modo pelo qual os sentidos se constituem nele”. Pg. 32.

 Observe a imagem a seguir com alguns apontamentos desses padrões construídos:
(Revista VIP: 2016 ed. 368)
http://goo.gl/LD7rZ1


2.2 – Desconstrução midiática

 Segundo Fiorin (2009), “Uma categoria semântica fundamenta-se em uma diferença, numa oposição. [...] abrange duas operações: negação e asserção” pg. 21 - 23. Em outras palavras, quando um discurso afirma uma coisa automaticamente nega outra e vise e versa. Isso pode ocorrer, de forma consciente ou inconsciente.

 Até o momento, foi discutida a construção dos padrões de estética feminina afirmados pela mídia que concomitantemente negam a existência de outros perfis.

 Observe a imagem a seguir:

(Maria Bethânia - Carnaval 2016)
 http://goo.gl/b3sEKJ

 Maria Bethânia aos 69 anos, foi homenageada no enredo da escola de samba Mangueira no carnaval 2016 do Rio de Janeiro contrariando todos os padrões estéticos ao desfilar com seus cabelos brancos soltos, vestido longo, pouca maquiagem e muitos adereços. Desta forma, tem-se exemplificado o que Fiorin afirma com sua teoria.

 A representatividade de Bethânia faz parte de todo um conjunto semiótico, ou seja, é acompanhada por outras vozes no interdiscurso e retoma acontecimentos anteriores e sua formação discursiva, portanto, nada é totalmente novo. Segundo Orlandi (2005): “[...] é preciso que o que foi dito por um sujeito específico, em um momento particular se apague na memória para que, passando para o “anonimato”, possa fazer sentido em “minhas” palavras”. Pg. 33 – 34.

 A formação discursivo-ideológica é representada através de signos que se revelam assujeitados a essa formação. O enredo da escola traz temas como candomblé, catolicismo, folclore, miscigenação, regionalismo e MPB. A escolha dos temas, da homenageada e dos símbolos semióticos constituí no discurso um rompimento com os padrões estéticos, religiosos e sociais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 Conclui-se com o desenvolvimento deste artigo que apesar da existência de exemplos como de Maria Bethânia, a mulher brasileira ainda é inferiorizada neste contexto, visto que a maioria das carnavalescas são jovens, pois a mídia ainda dita padrões e estes são seguidos à risca revelando o assujeitamento proposto pela AD.

 O meio artístico precisa de mais escolas com a atitude da Mangueira capazes de romper com essas ideologias dominantes e estabelecer outras formações discursivas que trabalhem temas polêmicos e tenham espaço para todas as estéticas, gerando um clima de pluralidade que o carnaval e também todos os espaços sociais deveriam ter.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] livro: FERREIRA, M. C. L. (Coord.). Glossário de Termos do Discurso. Porto Alegre: UFRGS/IL, 2005.
Disponível em: http://docslide.com.br/documents/glossario-de-termos-do-discurso.html

[2] livro: FIORIN, J.L. Elementos de análise do discurso. 14.ed. São Paulo: Contexto, 2009.

[3] livro: ORLANDI, E. P. Análise de discurso: Princípios & Procedimentos. 6.ed. Campinas, SP: Pontes, 2005.

[4] livro: ALTHUSSER, L. Ideologia e aparelhos ideológicos do estado. 2. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1985.

[5] site: http://carnaval.uol.com.br/2016/noticias/redacao/2016/01/05/mulher-melao-e-nova-rainha-de-bateria-da-inocentes-de-belford-roxo.htm
Acesso em: 18/05/2016.

[6] site: http://www.flickriver.com/photos/luftur-eventos/20180086431/
Acesso em: 18/05/2016.

[7] site: http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/carnaval/2016/noticia/2016/02/bethania-desfila-pela-mangueira-no-chao-apos-problema-com-guindaste.html
Acesso em: 18/05/2016.

[8] site: http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/bruno-astuto/noticia/2016/02/famosos-homenageiam-maria-bethania-no-instagram.html
Acesso em: 18/05/2016.

[9] site: http://vip.abril.com.br/revista/edicao-368/
Acesso em: 18/05/2016.